quarta-feira, 21 de setembro de 2016

A seca que já dura 5 anos

Plantação perdida em Poço Verde-SE
Há 101 anos atrás, a escritora Raquel de Queirós assistia ao flagelo da seca no seu Ceará. Ela tinha apenas 5 anos. Em 1930, a escritora estreava na literatura com o Romance O Quinze. Na narrativa consagrada, Raquel mostra o sofrimento de Chico Bento fugindo do sertão em busca de um lugar para continuar vivo. Hoje, o drama da seca com os humanos é bem menos trágico, embora já preocupante.
A seca atual que aflige o Nordeste teve início em 2012 e se intensificou desde então. Ela já dura cinco anos e é considerada a mais severa em várias décadas. A intensidade e a persistência da atual estiagem podem ser indícios de que as mudanças climáticas já começam a cobrar sua fatura, aponta um estudo publicado na revista Theoretical and Applied Climatology. Pode ser também a configuração do ciclo centenário da mudança climática. Em 1915 tivemos também uma seca impiedosa. Naquela época foram cerca de 50 mil mortos.
O drama da seca também foi retratado em A bagaceira, de José Américo de Almeida. O romance retrata as secas de 1898 e 1915. Agora, "as projeções de clima geradas pelos modelos climáticos sugerem que, daqui para a frente, as estiagens mais severas e prolongadas tenderão a ser a regra, não mais a exceção", afirma o hidrologista e meteorologista José Antonio Marengo, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) em Cachoeira Paulista, no interior de São Paulo. A afirmação foi feita em reportagem sobre o fenômeno no portal UOL.
Em 1932 tivemos outra longa estiagem. Esta inspirou Graciliano Ramos a escrever o seu Vidas Secas. Portanto, o problema é de sempre, a cada 17 anos, um fenômeno natural no Nordeste. Há relatos da sua incidência desde o século 16, ou seja, desde o início da colonização do país. O clima hoje é semiárido, mas no futuro poderá não ser mais. Em outras palavras, o sertão pode se tornar uma zona árida e favorecer um processo de desertificação, afirma Marengo.
Atualmente, durante os meses chuvosos, há intervalos sem precipitação que duram de cinco a seis dias. O que as projeções indicam é que esses intervalos "secos" tenderão a ser mais numerosos e mais longos, podendo alcançar 40 dias. Menos chuva significa também dias mais quentes. Segundo Marengo, a temperatura média no Nordeste já aumentou 0,8ºC entre 1900 e 2000 e as projeções indicam que, na melhor das hipóteses, o aquecimento vai aumentar 2ºC até 2040. No pior dos cenários, até 4,4ºC até 2100.
Na nossa região, ao longo de todo o vale do Rio Real, que separa Sergipe da Bahia, o inverno foi muito fraco. A safra de milho e feijão teve quase perda total. É bom que se diga, a seca aqui ainda é considerada moderada. Há lugares onde ela já dura 5 anos.  Com menos chuvas e mais calor ao longo do ano, a vegetação típica da caatinga tenderá a ser gradualmente substituída pelas cactáceas, que são vegetação típica de desertos. O impacto disso para a agricultura, principalmente a familiar e de subsistência, será incomensurável.

(Com a colaboração do UOL)